Foto: Bartolomeo chega à presidência depois de mais de dez anos de carreira na Vale: obsessão por excelência operacional

O presidente interino da Vale, Eduardo Bartolomeo, que assumiu no sábado depois do afastamento temporário de Fabio Schvartsman, terá duas prioridades imediatas no comando da companhia, na avaliação de especialistas da indústria de mineração e de fontes ligadas à companhia. A primeira missão será melhorar o diálogo com as autoridades responsáveis pelas investigações de Brumadinho com o objetivo chegar, o mais rápido possível, a um acordo definitivo com as famílias das vítimas da tragédia. O outro foco será reequilibrar a produção de minério de ferro da empresa em Minas Gerais, o que passa por conseguir a liberação de Brucutu, mina importante para a Vale no estado, e ainda das pelotizadoras de Vargem Grande e de Fábrica, que permanecem paralisadas.

A assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) pela Vale com as autoridades a respeito das reparações definitivas de Brumadinho, é considerada essencial para que a empresa consiga retomar uma situação de normalidade operacional. A Vale, no momento, tem sua reputação profundamente arranhada pelo desastre, e fatos subsequentes, que levou à morte 186 pessoas. Outras 122 ainda são dadas como desaparecidas.

Bartolomeo é visto no setor como um executivo cuja principal característica é a busca pela excelência operacional. "Ele é obcecado com eficiência", disse fonte. Com 54 anos, conhece bem a Vale. Até ser nomeado presidente interino pelo conselho, dia 2, era diretor-executivo de metais, no Canadá. Antes já tinha trabalhado dez anos em diferentes posições de liderança na companhia.

Agora, o executivo terá uma missão mais espinhosa: vai precisar não só injetar oxigênio novo nas discussões com a Justiça, Ministério Público e comunidades afetadas como reorganizar a empresa do ponto de vista operacional. Fonte ligada aos acionistas controladores disse que a Vale vai precisar repensar a maneira de atuar e de deixar de lado atitudes de "soberba".

Pessoas da indústria mineral consideram ainda que a troca no comando deve trazer maior tranquilidade para o ambiente interno da empresa. A avaliação é que vai acalmar parte dos funcionários, que, depois de Brumadinho, passou a questionar se a diretoria-executiva não teria "ignorado" alertas sobre os riscos da barragem. No Canadá, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, disse que a Vale terá que arcar com as consequências. "Temos que esperar e, após apresentados os resultados [dos processos administrativos e penais em curso na Agência Nacional de Mineração e no âmbito da Justiça], a empresa vai arcar com as consequências", afirmou.

Impacto de Brumadinho na Vale em Minas Gerais já é de 90 milhões de toneladas/ano, metade do que produz no estado

Um interlocutor da indústria avaliou que talvez fosse adequado a Vale fazer um "mea culpa", o que pode ajudar na interlocução com a força tarefa de Brumadinho, mas esse posicionamento exige achar termos adequados para não expor pessoas, disse a fonte. Ninguém aposta no retorno de Schvartsman e de Peter Poppinga, ex-diretor-executivo de ferrosos, embora seus afastamentos sejam temporários até a conclusão das investigações. No lugar de Poppinga, assumiu Claudio Alves, executivo com larga experiência no mercado de minério de ferro. "Seria dar murro em ponta de faca", disse um executivo do setor referindo-se à possibilidade de Schvartsman e Poppinga reassumirem os cargos no futuro. Ambos apresentaram cartas de afastamento no sábado após a força tarefa de Brumadinho ter feito essa recomendação, na sexta-feira.

O Valor apurou que antes da apresentação das cartas o conselho da Vale já tinha decisão de acatar o pedido das autoridades. Partiu do conselho também indicar Bartolomeo, que chega como interino, mas tem chances de permanecer no cargo, a depender do seu desempenho e de mudanças previstas para acontecer na Vale até o fim de abril (ver matéria abaixo). Para fontes ouvidas, ele chega com força por não ser um "outsider" da mineração e por ser alguém que não estava envolvido até agora com o caso Brumadinho. Por outro lado, com a empresa sob intervenção do Comitê Especial de Investigação - um dos comitês criados após a tragédia -, Bartolomeo terá suas decisões como CEO limitadas, na visão de outra fonte. "Ele tem a desvantagem de não ter a sua diretoria [própria]." A condição de interinidade também não favorece.

Bartolomeo também vai precisar restabelecer a todo custo a confiança nas barragens, além de efetivar o processo de descomissionamento de várias barragens anunciado. A avaliação de fontes é que a Vale, mesmo que implemente outra tecnologia para os rejeitos, isso vai demandar um bom tempo.

No lado operacional, o impacto de Brumadinho na Vale em MG já é de 90 milhões de toneladas, diz outra fonte, metade do que a empresa produzia no estado. A desorganização da produção no estado vai além das duas pelotizadoras, Fábrica e Vargem Grande (11 milhões de toneladas). Atinge também o complexo de pelotização de Tubarão, ao lado de Vitória (ES). Um quinto do minério de Brucutu (que faz 30 milhões de toneladas por ano) era enviado para lá.

Devido ao desastre, a Vale começa a trazer pelotas de São Luís para atender Usiminas, Ternium, CSN e Gerdau. Clientes externos também são afetados: a empresa está deixando de abastecer o mercado com esse produto, gerando fortes aumentos de preço.