3 maneiras como o mensalão pode diminuir a corrupção no país
Brasil - Política - Corrupção
Ao debater os crimes dos réus do mensalão em longas discussões teóricas, os ministros do STF ampliaram a margem para que toda a justiça brasileira combata a corrupção
Que o Supremo Tribunal Federal condenou figuras antes poderosas e já delineia a possibilidade real de prisão para vários deles, todo mundo sabe. A questão agora é verificar se o julgamento – vendido como o início de uma nova era no combate à corrupção no Brasil – vai sobreviver às essas expectativas.
O que se pode afirmar com certeza é que, ao condenar 25 dos 37 réus, a mais alta Corte do país reforçou uma série de convicções jurídicas que podem facilitar a punição de corruptos e corruptores do país, do nível municipal ao federal.
“Vai formar um precedente importante que vai inspirar juízes do Brasil inteiro”, acredita Oscar Vilhena, professor de Direito Constitucional da Direito GV, em São Paulo.
Veja abaixo porque há espaço para um combate mais aguerrido à corrupção a partir do exemplo dos ministros e suas longas discussões que balizam a justiça brasileira.
1) Eles aplicaram a teoria do domínio do fato
Ao ser condenado pelo Supremo, o ex-presidente do PT, José Genoino, chamou a teoria do domínio do fato, um dos instrumentos teóricos utilizados para condená-lo, de “hipótese pré-estabelecida”, que prescinde de “evidências, testemunhas e provas”. Genoino diz que foi condenado apenas por ser presidente do PT.
Para juristas ouvidos por EXAME.com, esta é uma interpretação equivocada do domínio do fato. De maneira resumida, essa teoria defende que, se um superior tem poder para impedir uma ação criminosa cometida por subalternos ou fazer com que ela aconteça, de tal forma que sua vontade foi importante para a ocorrência do crime, então ele pode ser considerado culpado.
Esta interpretação – que, como salientou o decano do STF, Celso de Mello, não é nenhuma inovação do tribunal – permite que se acuse - e, por consequência, se condene – chefes e mandantes mesmo que eles não tenham assinado nenhum documento, por exemplo.
Mas isso não significa falta de provas, como vem apregoando condenados no mensalão.
“O tipo de prova é distinto. Em uma organização complexa, é mais difícil você encontrar prova material. Muitas vezes a prova se perde na teia corporativa”, afirma Oscar Vilhena, da Direito GV.
Os ministros do STF, ao se deixarem levar por uma série de testemunhos e indícios como reuniões entre os réus, divergiram da visão dita “garantista” de juízes que só aceitam provas periciais e documentais, o que já liberou muito corrupto no Brasil.
“O Supremo permitiu que a narrativa consistente da ação com um conjunto de provas circunstanciais gerasse a convicção do juiz”, afirma Oscar Vilhena.
2 – Eles deram importância às provas da fase de inquérito
A justiça valoriza, tal como determina o Código Penal, as provas produzidas em juízo, e não as da fase de inquérito e da apuração policial. Isso para garantir o direito ao contraditório e evitar que investigações corruptas condenem alguém injustamente.
O problema é a possibilidade do juiz acabar se prendendo sempre às provas da fase judicial.
“Existem provas que não serão produzidas de novo em juízo. Pode haver testemunha que venha a falecer ou que não seja mais encontrada, por exemplo”, explica o promotor de Justiça Criminal Christiano Jorge Santos, do Ministério Público de São Paulo. Ele considera este um legado do mensalão.
“Um réu que tenha sido ouvido e confessado ou imputado a culpa a terceiros, se em juízo ele resolver ficar em silêncio, o que ele disse antes não valeu absolutamente nada? Pode ser que não, mas o somatório de todos os indícios vale”, afirma o promotor.
E foi isso que os ministros do mensalão lembraram a todos os juízes do país, ao citarem, por exemplo, depoimentos colhidos na CPI dos Correios, em 2005.
3 – Eles entenderam de forma ampla crimes como corrupção passiva e formação de quadrilha
Uma parte dos advogados dos réus defendeu em Brasília que não havia provas de que os deputados haviam votado a favor do governo porque receberam propina do mensalão.
Ou seja, o dinheiro até foi recebido, mas não se podia dizer que servia para que os parlamentares votassem de determinada maneira. Foi dito, aliás, que era tudo caixa 2, o que caracterizaria outro crime, de pena mais branda.
Mas os defensores foram surpreendidos com a visão, vencedora no colegiado do Supremo, de que não era preciso provar que o voto se concretizou a partir do dinheiro. Para caracterizar corrupção passiva, o importante era que o montante foi recebido.
Como exemplo, o mesmo pode acontecer com algum funcionário público que recebeu para relaxar a fiscalização em determinada vistoria. Se ele recebeu dinheiro de uma empresa cuja obrigação é fiscalizar, a acusação não precisaria provar, em tese, que ele de fato relaxou em seu dever para conseguir a condenação. A punição, porém, poderia ser aumentada se isso ficasse comprovado.
Raramente julgando assuntos penais em primeira mão – normalmente só corroboram ou não processos de instâncias inferiores - o Supremo discutiu com profundidade o conceito e a abrangência de lavagem de dinheiro, corrupção passiva, formação de quadrilha, entre outros.
E pode ser que a visão dos ministros neste processo influa no julgamento de um deputado estadual pelo Tribunal de Justiça ou de um governador pelo Superior Tribunal de Justiça.
O mesmo pode ser dito de formação de quadrilha. Como disse o relator do processo Joaquim Barbosa, os crimes praticados por homens de “terno e gravata” trazem um desassossego ainda maior que os “chamados crimes de sangue”, cujos integrantes são normalmente associados ao delito.
“É uma aplicação mais isonômica para um crime que você associava somente a quadrilha de sequestro, roubo e tráfico”, afirma Oscar Vilhena, da Direito GV.
Consequências
Outro fator que pode influenciar o trabalho da justiça brasileira é a clara sinalização do STF da intolerância do judiciário com a corrupção.
“Acho estranho e muito grave que alguém diga com tanta tranquilidade que houve caixa 2. Fica parecendo que ilícito no Brasil pode ser praticado, confessado e tudo bem", reprovou a ministra Cármen Lúcia, no dia 9 de outubro, referindo-se à Delúbio Soares
O STF, enfim, reforçou certas interpretações do Código Penal e do Direito, mas não inventou nada que já não existisse.
“Não é uma aberração jurídica. Todos os votos foram fundamentados e debatidos em público. Não há como falar em juízo de exceção”, defende o promotor Christiano Jorge Santos, também professor doutor da PUC-SP.
Resta saber se as condenações do mensalão serão regra ou exceção na história brasileira daqui em diante.
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