Economia30/10/2010
"O Brasil já é um poder global"
Do 22º andar de um hotel em São Paulo, o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair olha pela janela com admiração.
Modernos edifÃcios à s margens do rio Pinheiros comprovam que ele estava certo ao convidar o PaÃs para participar das reuniões do G-8, quando era um dos homens mais poderosos do mundo. A potência emergente já emergiu. “Hoje, nenhum problema polÃtico, econômico, de segurança e de meio ambiente pode ser solucionado sem o Brasilâ€, afirma Blair, que governou por dez anos, até 2007, e é o atual enviado da ONU, dos EUA, da União Europeia e da Rússia ao Oriente Médio. Ele foi a estrela do seminário promovido pelo Lide - Grupo de LÃderes Empresariais na terça-feira 26. Depois, recebeu a DINHEIRO para uma entrevista exclusiva. “Adoro o Brasil. Gostaria de ficar mais tempoâ€, disse.
Entrevista:
Nos últimos anos, o Brasil ampliou seu papel na polÃtica internacional. Junto com a Turquia, fez um acordo com o Irã que foi muito criticado. Esse papel de protagonista na polÃtica mundial cabe ao Brasil?
A maior mudança do mundo é a revolução pela qual a geopolÃtica está passando. Hoje, nenhum problema polÃtico, econômico, de segurança e de meio ambiente pode ser solucionado sem o Brasil. É simples assim. Podemos debater essa ou aquela iniciativa. O fato é que o papel do Brasil como um poder global é uma realidade.
No caso da questão nuclear do Irã, o Brasil ajudou ou não?
Tentar sempre ajuda. Sou muito linha dura com o Irã, mas admiro o presidente Lula e entendo por que ele quis fazer isso. Se essas iniciativas funcionarem...Todos queremos soluções diplomáticas para esse problema.Â
É possÃvel ser amigo do presidente do Irã, Ahmud Ahmadinejad? Dá para dialogar com ele?
Sou a favor do diálogo, mas sempre com os meus olhos abertos. O presidente Obama estendeu a mão da amizade ao Irã em seu discurso no Cairo, em março de 2009. Ele disse que o Irã tem um grande povo e uma grande civilização. Queremos fazer uma boa parceria com o Irã, mas precisamos que eles queiram o mesmo. O problema é que as ações do presidente Ahmadinejad são muito provocativas.
 O sr. vê uma ameaça nuclear?Â
Sim. Basta olhar o discurso de Ahmadinejad nas Nações Unidas, há poucas semanas. Você gostaria de ver a pessoa que disse aquilo com uma bomba nuclear? Creio que não.
O seu primeiro emprego público foi o de primeiro-ministro. Dilma Rousseff nunca disputou uma eleição e agora tem chance de ser presidente do Brasil. Sem experiência, ela poderia ser uma boa presidente?
A eleição é um assunto para os brasileiros decidirem, não para um forasteiro. Francamente, eu não tinha tido emprego no Executivo antes de ser primeiro-ministro. Obama também não. Isso não é incomum hoje em dia.
Obama enfrenta um grande problema hoje. As eleições estão chegando e o Tea Party, facção de extrema direita, tem crescido. Os Estados Unidos poderiam se movimentar para a direita do espectro polÃtico, como aconteceu recentemente na Inglaterra?
A polÃtica atual é muito volátil em todo o mundo. Talvez seja menos volátil no Brasil do que em outros paÃses. Na Europa, as eleições têm sido todas muito estranhas. Não sei como vai ser com Obama, mas não é raro o presidente dos EUA sofrer dificuldades no meio do mandato e depois voltar com força.Â
Se Obama perder a maioria no Congresso, o governo pode emperrar?
Ele pode superar isso, pois não precisa do Congresso para tudo o que irá fazer. A questão é se a polÃtica econômica vai funcionar ou não. Há um grande debate no mundo sobre a saÃda da crise.
O dinheiro público gasto para estimular a economia nos Estados Unidos e no Reino Unido foi pouco ou muito?
A ação de estÃmulo pelos governos foi necessária. Para ir adiante, as pessoas precisam ver um plano com uma incrÃvel redução do déficit, que resgate a confiança. Há uma diferença entre o Estado intervindo para estabilizar a economia e o Estado dar uma virada na economia. O que vai levar o paÃs adiante é o empreendimento, é a eficiência do setor privado. Precisa haver um equilÃbrio entre a ação estatal para lidar com a crise e a inovação e a criatividade do setor privado, que são o motor do crescimento.
Quanto tempo vai levar para a crise econômica terminar?Â
Eu estaria mais otimista se achasse que há um consenso global sobre a polÃtica a ser adotada. Os paÃses podem tentar achar uma direção comum ou brigar entre si, o que é um perigo. Como eles fariam isso? Com protecionismo comercial, com o câmbio. Quanto maior for a coordenação da polÃtica global, melhor.
Se o sr. fosse ao encontro da cúpula do G-20 em Seul, em novembro, o que defenderia?
Primeiro, precisamos achar uma saÃda cooperativa para alguns dos desequilÃbrios globais. O comércio mundial precisa ser mais equilibrado, por isso a discussão sobre as moedas é tão importante. Segundo, precisamos de alguns procedimentos para uma supervisão financeira e bancária global. Sou mais favorável à supervisão do que à mão pesada da regulação. As polÃticas que poderiam ter prevenido a crise financeira não são necessariamente as que precisamos hoje para sair dela. Precisamos que o setor financeiro volte a andar, garantir que as empresas tenham espaço e incentivo para ser o motor do crescimento das nossas economias. O problema, em muitos paÃses, não é que os bancos estão sendo irresponsáveis, mas, sim, que não estão emprestando.
Como vê o novo governo de coalizão no Reino Unido, que acaba de baixar um pacote impopular de corte de gastos?
Inevitavelmente, é preciso ter um plano para conter o déficit público. Todos os paÃses estão fazendo isso. O Brasil não está. O Brasil tem sorte, está numa posição diferente. Nas economias desenvolvidas, como Estados Unidos e Europa, todo mundo tem um plano de contenção do déficit. Todos são impopulares. Precisamos aproveitar a oportunidade para fazer reformas mais rápidas e profundas na assistência social e nos serviços públicos. Não estamos gastando pouco dinheiro. Mesmo com a redução do déficit, iremos gastar 40% da renda nacional no setor público. Como está, o sistema de pensões nos paÃses europeus desenvolvidos é insustentável. Eles precisam entender que não se trata de competir hoje, mas daqui a 10, 20 ou 30 anos. Temos que ser competitivos em áreas como educação, impostos, ambiente de negócios. Os sistemas de bem-estar social precisam ser realistas. Do contrário, vamos ver que paÃses como o Brasil vão se desenvolver, crescer e crescer, e teremos tempos difÃceis.
Como vê o papel do Brasil, da Ãndia e da China no futuro?
Não há dúvida nenhuma de que o mundo mudou fundamentalmente e o século XXI será o dos paÃses emergentes, como o Brasil, a China, a Ãndia. Até a Indonésia. É um paÃs muito interessante, está na fase que o Brasil vivia há dez anos.Â
Na América Latina, ainda há lÃderes populistas e polÃticas nacionalistas que causam preocupação, como Hugo Chávez na Venezuela e Evo Morales na BolÃvia. Como analisa essa situação?
Esse tipo de populismo sempre acaba do mesmo jeito. Uma questão polÃtica primordial é entender o que funciona no século XXI. O difÃcil é fazer o que é necessário, mudar as instituições, a burocracia. Sabemos o que funciona. Por que o Brasil tem tido um desempenho tão melhor nos últimos 15 anos? Porque teve governo estável. O que deu confiança foram as reformas de mercado do presidente Fernando Henrique Cardoso, continuadas pelo presidente Lula. Por que a China saiu-se tão bem desde os anos 70? Porque se abriu. A Ãndia também fez reformas e progrediu.
O sr. se arrepende de alguma coisa que fez no poder? Faria diferente?
Sim, claro, seria loucura se achasse que fiz tudo perfeitamente. Eu sei o que faria diferente, as pessoas que descubram.
Na guerra do Iraque, o sr. iria em frente da mesma maneira?
Já falei sobre isso mil vezes, não há muito o que possa adicionar. No governo, você toma decisões com as quais precisa viver.
Sua visão mudou desde que saiu do governo?
Não, ainda acho que enfrentamos uma enorme batalha contra o extremismo no mundo todo. Temos que confrontar e derrotar o extremismo.
O sr. escreveu que não existe solução diplomática convencional para o conflito entre Israel e Palestina. Como pretende ajudar a alcançar a paz?
Há uma grande chance para a paz. Ela precisa ser construÃda de baixo para cima e, ao mesmo tempo, negociada de cima para baixo. A chave é criar um Estado palestino. Precisa haver um Estado de Israel seguro e um Estado palestino viável. Isso não irá acontecer se não houver mudanças nas ruas. O problema real não é encontrar soluções para as fronteiras, os refugiados e Jerusalém. O problema é a realidade de cada lado. Para Israel, é a segurança. Do lado palestino, a ocupação.
E como mudar isso?
Construindo a capacidade palestina de fazer segurança. É o que tem feito o primeiro-ministro Fayyad (Salam Fayyad, da Autoridade Nacional Palestina). Acontecerem grandes mudanças na Cisjordânia. Os israelenses levantaram algumas restrições e a economia palestina está crescendo 10% a 12% no momento. Não pode haver uma negociação bem-sucedida se a realidade das ruas não mudar. Quem vê o problema de fora não entende. Sempre que explico, pego um mapa e mostro uma grande região. Mal dá para ver Israel e os territórios palestinos. Ambos caberiam numa pequena esquina do Brasil. Isso significa que a questão da segurança para os israelenses não é uma coisa distante, é a absoluta realidade do cotidiano. Para os palestinos, é a humilhação, as restrições à movimentação. Mudar isso é tão importante quanto as negociações polÃticas.
Já houve progressos?Â
Sim. Na Cisjordânia, a economia está crescendo, estão reduzindo o déficit orçamentário, cortando o desemprego. Temos agora uma nova polÃtica para a Faixa de Gaza, que está mudando as coisas muito devagar. Fayyad está criando instituições para manter a lei e a ordem, reformou o ambiente de negócios. Tivemos duas conferências em Belém para atrair investidores. Há coisas boas acontecendo, mas a parte polÃtica empacou.
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